23.4.06

 

pra que pensar, se a direção da une faz isso por nós?

por vinícius furuie

Insólito. Pois a luz branca do projetor exibe teses políticas, a mesa narra o processo de votação enquanto massas de estudantes gritam uns contra os outros sem se ouvir. Faixas propagandeiam que o candidato favorito da juventude do PMDB é o Itamar Franco e que libertar o Brasil é construir o socialismo. Ao ouvido chega a noticia de que quem não pula e governista, quem é contra a política do PT federal é direita disfarçada, uma kombi passa anunciando a venda de cerveja socialista, a ‘internacional comunista’ ecoa arranhada e em mono, por força de uma caixa de som quebrada.

Sim, o 9º Coneb (Conselho de Entidades de Base) da UNE teve seus momentos ‘Kafka potencializado por LSD’. Mas felizmente não foi apenas um pesadelo.

Antes, um pouco de contexto. Tudo começou para mim e meus colegas de faculdade com uma série de perguntas. O que se faz quando a sua entidade representativa nacional é hegemonizada e contrária a seus posicionamentos políticos? O que se faz quando o senso comum da universidade instala o clima de decepção niilista com os seus representantes mas não contribui para desafiá-lo? E quando esses mesmos donos do poder lhe convocam para um conselho nacional onde se sabe que não haverá chance para a oposição?

Acreditando na importância cabal dessas perguntas e que somente a diretoria do Centro Acadêmico não era suficiente para respondê-las, as questões foram colocadas perante todos os estudantes e a resposta da minha faculdade foi decidida em Assembléia.. Por 19 votos a 4 decidiu-se tomar parte e mandar um delegado à UNE. Determinada nossa participação, restava saber quais idéias seriam defendidas. Para isso montou-se um Grupo de Trabalho aberto para discutir as pautas – que também teve a função de nomear este que escreve como delegado – e partimos para Campinas. E tudo começou bem.

Os debates sobre a reforma universitária e a defesa do passe-livre estudantil foram ricos, pluralistas e surpreendentemente divertidos. A argumentação (tanto a bem articulada, pelo brilhantismo, quanto a escabrosamente estúpida, pelo humor do absurdo), o clima de disputa ideológica e a abertura a quem quisesse falar tornaram os eventos rigorosamente estimulantes. Falou-se muito. Estudantes de toda parte narraram acontecimentos regionais que de outra maneira jamais tomaríamos conhecimento. A reflexão e o questionamento imperaram pela maior parte do tempo.


As teses dos campos políticos foram distribuídas a todos interessados. Pelos gramados do ciclo básico da Unicamp (Universidade de Campinas), grupos de discussão sem ostentar esse título se agrupavam e confabulavam sobre todo tipo de coisa, inclusive contra aquele próprio conselho do qual estavam participando.

Sem contar os momentos de política subjetiva, mas de importância incontestável. O que incluiu ouvir a delegação do Pará batucando até bem depois das 4 da manhã, deixar-se integrar com os estudantes por afinidade de área, campo político ou simplesmente pessoal, e, finalmente, protestar e demonstrar nossa insatisfação quando nos faziam sentir como gado. Pois sentíamos ofendidos quando gritos de guerra foram priorizados em detrimento de falas, teses herméticas sobrepostas a pontos de pauta, ideologia sobre idéias.

E essa revolta foi mister para entender por que o Coneb não foi o que poderia ter sido e porquê a União Nacional dos Estudantes não é o que poderia ser. O Coneb nos fez sentir como bovinos. A UNE trata os estudantes não como seres pensantes, mas como massa de manobra para os interesses do Partido. A escolha feita foi a da massificação sem inclusão, o desprezo pela base, a glorificação da direção.

E eis que se explica o surrealismo da plenária final. O momento mais importante do Conselho, onde as deliberações para UNE são tomadas, foi uma “briga de torcidas cegas”, nas palavra do estudante da UFPR (Universidade Federal do Paraná) que protestava sozinho do lado de fora, nariz vermelho de palhaço e placa clamando aos estudantes para não se submeterem àquela massificação.

Os momentos de votação foram de ratificação do que já havia sido decidido. Pior, por vezes era impossível distinguir se o que se passava era uma votação, pois a voz da mesa estava encoberta por urros e gritos.

Tamanha foi a desorientação que as resoluções do Conselho em si perderam largamente sua importância perante a pergunta que se impôs num cartaz na saída do ginásio da Unicamp: “Até quando o Movimento Estudantil vai ser briga de torcidas organizadas?”
[r]

fotos. vinícius furuie


comentários:
Cara, o Coneb foi muito non-sense. Desde aquelas plenárias onde todo mundo grita e ninguém ouve, passando pela baladinha puts puts que aquela tese organizou no meio da Unicamp, até a galera que grita "a une é pra lutar" quando tá todo mundo cantando Chico ou Raul de madrugada... Mas te falo que no fim das contas até que foi interessante. Apesar da UNE...
 
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