2.6.06

 

conferência fortalece movimentos
de direitos humanos

CONFERÊNCIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
por fernanda campagnucci

A expectativa para a 10ª Conferência Nacional de Direitos Humanos era grande. Reunidos em Brasília de 31 de maio a 2 de junho, cerca de 700 representantes de organizações e movimentos sociais trouxeram denúncias e experiências de suas cidades. Os aplausos dos militantes na mesa de abertura, por vezes de pé, traduziam nas palmas a esperança de se avançar nas discussões sobre os direitos humanos e seus defensores.

Apesar de o tema central da Conferência ser "Modelo Econômico e Direitos Humanos", a temática mais expressiva – discutida em todos os painéis e grupos de trabalho –, foi a questão da segurança pública. Segundo Paulo César Carbonari, da Coordenação do MNDH (Movimento Nacional de Direitos Humanos), o debate foi motivado com os crimes em São Paulo, há duas semanas, e o processo de criminalização dos defensores dos direitos humanos que emergiu dali. "O momento histórico exige essa reação", afirma.

Ainda na abertura do evento, Carbonari se mostrou bastante animado com a realização da Conferência. Sentado no chão, como os outros que não couberam nas 350 cadeiras do auditório lotado, ele já esperava resultados concretos da Conferência. Para ele, não se avançou desde a última, que aconteceu em 2004. E "ficar parado, em Direitos Humanos, é andar para trás", acrescenta. Depois de participar dos três dias de discussões, o professor de filosofia em Passo Fundo (RS) avalia os avanços e desafios da 10ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, que terá uma carta compromisso com as conclusões discutidas e aprovadas pelos participantes.

Qual é sua avaliação desses três dias de debates?
A Conferência é sempre um processo importante porque fortalece os movimentos, ajuda a troca de experiências e mantém as pessoas animadas nessa luta. Levantou-se um conjunto de temáticas nos seus painéis e grupos de trabalho, inclusive propostas que são fundamentais para que possamos fazer dois movimentos substantivos. Um deles é manter e fortalecer a luta, estruturar-se contra esse processo de exclusão e também pela transformação das instituições no país. Mas também ficou muito forte a idéia de que há uma cultura, um movimento conservador, que tem crescido nestes últimos tempos. Os eventos das últimas semanas ajudaram a dar mais espaço para esta posição conservadora refratária dos Direitos Humanos e que se traduz objetivamente no processo de criminalização das lideranças dos defensores e também de movimentos sociais. Esses dois componentes ficaram muito fortes e explícitos nesta Conferência.


Que dificuldades se encontram neste tipo de conferência?
Na Conferência de Direitos Humanos ainda sofremos um mal substantivo: nós não conversamos com a sociedade, infelizmente. Esse é o nosso maior limite e o nosso grande desafio. Porque se nós queremos transformar estruturalmente e incidir nessa cultura refratária nós temos que abrir um diálogo mais significativo com a opinião pública. A ação dos meios de comunicação de massa é importante, mas não basta isso. Precisamos montar estratégias para ampliar esse debate.

Como é possível ampliar esse debate para a sociedade?
São algumas frentes estratégicas. A primeira é o investimento maciço na Educação e a formação permanente das pessoas. Por isso a Educação em Direitos Humanos tem um papel fundamental. O segundo aspecto é que os movimentos devem ir para a rua, marcar presença. Ainda estamos no anonimato. Aparecemos, em geral, com a opinião pública contrária a nós. "Esses são os fulanos que defendem os bandidos", como se defender seres humanos não fosse correto. Mas acho que temos que ter uma ofensiva mais pública, e positiva. Um terceiro aspecto são os investimentos em massa. Gasta-se muito em publicidade, mas o governo deveria fazer uma grande campanha de mídia – daquelas que não se consegue senão pagando –, campanhas institucionais, de promoção dos direitos humanos e afirmação da atuação de seus defensores. Esse momento histórico exige essa reação.

E quais foram os avanços que a 10ª Conferência trouxe para o Sistema Nacional de Direitos Humanos?
Os dois grupos que discutiram estratégias concretas para o Sistema Nacional de Direitos Humanos – um que discutiu Conselhos e o outro Política Nacional – acumulou um diagnóstico importante da situação e sobretudo um conjunto de propostas. A primeira é que a gente aprove o projeto de lei que cria o Conselho Nacional de Direitos Humanos, mesmo tendo críticas a ele – nos comprometendo com um projeto de revisão e aprimoramento em seguida; a segunda proposta, quanto à Política Nacional, é uma questão-chave: vamos fazer um diagnóstico e uma avaliação profunda da Política Nacional de Direitos Humanos de tal maneira que possamos angariar posições para já no ano que vem fazermos a atualização do Programa Nacional de Direitos Humanos.

Como foi a atuação do Governo nesse sentido?
Nessa direção do Programa Nacional o Governo foi fraco. Ele não pode editar uma lista de ações, tem que vincular a questão orçamentária e traduzir em possibilidade de ação. Na Conferência esses foram avanços significativos.

A temática central da Conferência é justamente a relação entre o modelo econômico e a sociedade. Essa discussão foi desfocada pelo debate da segurança pública?
O tema do modelo econômico é novo para os movimentos. Nem as organizações de defesa de direitos humanos tem um acúmulo e uma atuação consistente com esse viés. Esse tema foi posto mais como uma provocação para que as próprias organizações da sociedade civil percebessem que a questão do desenvolvimento tem a ver com direitos humanos, do que esperar um acúmulo mais propositivo. De fato, a Conferência não conseguiu se concentrar nesse tema. Mas isso é conseqüência desta realidade: ainda não temos uma compreensão indivisível dos Direitos Humanos. As organizações discursam isso, mas o tema ainda não está incorporado. Só o fato de termos posto esse tema é uma espécie de ação afirmativa, mostra que ele também faz parte dos direitos humanos. [r]

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por que não uma lei de responsabilidade social?


CONFERÊNCIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
por fernanda campagnucci

Não se defende os Direitos Humanos sem mudar o modelo econômico vigente. Com base nesta premissa, representantes de movimentos sociais de todo o país discutiram alternativas à Lei de Responsabilidade Fiscal (LFR) no segundo dia da 10ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, que acontece em Brasília de 31 de maio a 2 de junho.

A Lei de Responsabilidade Fiscal – promulgada em 2000 - é o sustentáculo jurídico para o superávit primário, mecanismo criticado pelos conferencistas por desviar recursos públicos dos gastos sociais para pagamento de juros. A lei de Responsabilidade Social segue a lógica inversa: vincula a administração pública a metas de implementação de políticas públicas. Maria Lúcia Fatorelli, auditora Fiscal da Receita Federal, enfatiza: "O que está se fazendo com a atual política econômica é uma transferência de renda dos mais pobres aos mais ricos".

Em 2005, o governo gastou R$ 139,1 bilhões apenas de juros e amortizações da Dívida – interna e externa -, R$ 58,77 bilhões a mais que todo o gasto com Saúde, Educação, Assistência Social, Organização Agrária, Segurança Pública, Habitação, Cultura e Saneamento juntos, de acordo com os dados do Fórum Brasil do Orçamento (FBO).

Fatorelli propõe uma "Auditoria Cidadã", para abrir a "caixa preta" da dívida pública. Para ela, todo cidadão brasileiro deve se perguntar de onde essa dívida surgiu, quem se beneficiou com ela e onde foram aplicados esses recursos. Além da auditora, compuseram ao painel "Modelo Econômico e Direitos Humanos" na Conferência Luiza Erundina, deputada federal (PSB-SP) e ex-prefeita de São Paulo, Márcio Pochmann, professor de Economia da Unicamp e Hildete Pereira de Melo, professora de Economia da UFF (Universidade Federal Fluminense).

Dívida Social

Contabilizar a dívida social é um dos desafios propostos pelos conferencistas. Márcio Pochmann defende que um conselho seja criado dentro do próprio Estado para mensurar o quanto deve ao povo brasileiro. "Precisamos trilhar o mesmo caminho que foi feito nos anos 80 para dimensionar a dívida pública, quando, após intenso debate, ela foi reconhecida e oficializada", diz.

Hildete de Melo reforça a necessidade de se reconhecer o trabalho da mulher em casa, que permanece invisível no cálculo das Contas Nacionais brasileiras. A pesquisadora mediu, em parceria com os também economistas Claudio Considera e Alberto Di Sabbato, que o trabalho de lavar, passar, cozinhar, cuidar dos filhos e administrar a casa se traduziriam em R$225,4 bilhões em 2004, uma fatia de 12,76% do Produto Interno Bruto (PIB).


Após o painel, na parte da tarde, um grupo de trabalho se propôs a organizar as demandas que surgiram na exposição dos economistas. Uma das resoluções tiradas pelo grupo é apoiar e exigir a aprovação do projeto de lei complementar apresentada pelo FBO, em tramitação na Câmara dos Deputados, que inclui os parâmetros sociais na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRFS). Além da lei, os participantes sugeriram a formulação de diretrizes para a distribuição de riquezas e a cobrança de impostos sobre as grandes fortunas. [r]

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negros denunciam extermínio racial


CONFERÊNCIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
por tadeu breda

A aliança entre racismo e violência foi um dos temas abordados no segundo dia da Conferência Nacional de Direitos Humanos (CNDH), que teve início no dia 31 de maio e vai até 2 de junho, em Brasília. Representantes do movimento negro e quilombola, promotores e justiça e policiais sentaram para discutir o que chamaram de “extermínio dos jovens negros” na sociedade brasileira.

Por extermínio entende-se “a morte sistemática por balas letais, tiros na cabeça, nuca, tórax, como acontecia na década de 70, com a atuação da Rota, e que teve continuidade com os esquadrões da morte, a Scuderie Le Cocq”, diz Deise Benedito, do movimento Fala Preto, de São Paulo.

Para Deise, existe um projeto político que vigora no país desde a abolição da escravidão, em 1888. “A população jovem trazida da África para trabalhar nas minas e fazendas de cana-de-açúcar perderam seu valor econômico com o fim do regime escravocrata”, explica. “Com a imigração, o colono europeu passou a ter acesso à escola e ao trabalho, enquanto que para o negro não houve políticas públicas de moradia, saúde ou educação.”

A militante faz eco com as palavras do ex-delegado carioca Hélio Luz, que no documentário Notícias de uma guerra particular (1999) diz que a polícia faz “política de repressão” e “mantém o pobre na linha, pagando imposto e sem reclamar”. Deise afirma que o projeto branco da sociedade brasileira estigmatiza como inimigo o negro jovem, desempregado e morador de favela.

A criminalidade entra, então, como uma alternativa de vida aos adolescentes pobres das grandes cidades. “As crianças estão mergulhadas num cenário de colaboração entre o tráfico e os moradores. O Estado até agora entrou apenas de forma paliativa, omissa, corrupta e perversa”, declara Carmem Silveira, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos do Governo Federal.

Polícia

Apesar das críticas constantes ao papel da polícia, membros da corporação estiveram presentes à discussões. Um deles é o sargento Absolon, da PM baiana, que exibe com orgulho recortes de jornal sobre sua atuação comunitária junto às crianças de Vitória da Conquista. Ele, que diz fazer o policiamento desarmado, afirma que a maior missão da polícia é implantar os direitos humanos. “Temos um projeto em que crianças, adolescentes e seus familiares vão pra dentro do quartel jogar capoeira e conhecer a função do policial. Chegamos a ter, de 1995 a 1997, mais de mil alunos.”

No mesmo tom conciliador, o tenente-coronel Rivaldo, da PM goiana, coloca que “o objetivo da polícia é a defesa da vida. Mas hoje a corporação enfrenta uma agressão social”. Segundo ele, colocar a polícia em pólos negativo (ou positivo) ou os defensores de direitos humanos em pólo positivo (ou negativo) é errado. “A gente não tem que polarizar, tem de mudar comportamentos.”

Existe uma troca de farpas bastante intensa entre defensores dos direitos humanos, policiais e opinião pública. Uns são acusados de “defender bandido” ou de “humanistas”, outros de “assassinos” ou “defensores da ordem”, conforme o contexto social.

Nessa discussão, os ataques do PCC à polícia paulista se transformaram num marco, a todo momento lembrado. A onda de violência chegou a mudar até mesmo a tônica da CNDH, que originalmente discutiria o modelo econômico neoliberal mas acabou se rendendo à segurança pública. [r]

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1.6.06

 

tom da abertura é de crítica
ao governo e de defesa aos militantes

CONFERÊNCIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
rafael sampaio


A 10ª Conferência Nacional pelos Direitos Humanos começou na quarta-feira (30) com críticas aos ataques sofridos pelos defensores de direitos humanos. "Eu temo que a onda de violência em São Paulo leve a um avanço do pensamento reacionário e de grupos de extrema-direita no Brasil", diz o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.

O deputado, que compôs mesa com o ministro da SEDH (Secretaria Especial de Direitos Humanos) Paulo Vannuchi Leme, com a deputada Maninha (PSOL-DF), com o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) e com Ivônio Barros, coordenador do Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos, criticou duramente o pacote de leis aprovado pela Câmara no calor do ataque do PCC, chamado de "pacote do pânico" pelo Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.

"Neste mesmo plenário, já vi serem propostas leis para redução da maioridade penal. Isso é um absurdo", desabafa. Para Ivônio Barros, os defensores de direitos humanos estão sendo ameaçados por forças retrógradas, que abusam de bordões como "direitos humanos para humanos direitos" e "bandidos não tem direitos humanos". "Pedem pela implantação da pena de morte, mas se esquecem de que ela já existe", lamenta o coordenador do Fórum, referindo-se a mortes seletivas "que atingem os negros e os pobres, todos eles cidadãos brasileiros".

O tom da mesa de abertura foi crítico ao governo e à política econômica, muito "neoliberal" na opinião de Barros. Para ele, a reforma agrária se arrasta, sem rumo; as políticas indigenistas param e há autoridades que "têm coragem de dizer que eles exigem terra demais"; o Judiciário é um bastião de defesa das elites; e os últimos três anos da SEDH foram frustrantes.

Mas a esperança com outro caminho possível foi explicitada pelos membros da mesa, desde que existam alternativas ao atual modelo econômico e que seja combatida a corrupção. "Se de cada quatro prefeituras deste país, três estão envolvidas com desvio de dinheiro público, como vão existir políticas públicas que funcionem?", brada Barros. Para Cristovam Buarque, existe apartação social no Brasil, tanto de raça quanto de classe. A tragédia de São Paulo foi uma consequência da desigualdade social. "O massacre foi cometido contra os que são estranhos para nós, de classe média. Não os vemos como semelhantes", diz ele.

"O Brasil precisa de uma política nacional de direitos humanos que não seja alterada pelos interesses partidários", diz Paulo Vannuchi Leme. Ele reconhece que o governo Lula errou ao rebaixar o status de Ministério da SEDH nos anos passados. Para Leme, se não houver política pública de longo prazo para os direitos humanos, eles não serão implantados plenamente.

Greenhalgh criticou, ainda, a criminalização que a Justiça comete contra os ativistas de direitos humanos e os líderes de movimentos sociais. Ele clamou aos participantes da Conferência para que fosse feito um "ato de desagravo" em defesa dos militantes incriminados. "João Pedro Stédile (MST), Conceição Paganele (AMAR), Luiz Gonzaga da Silva, o Gegê (militante dos sem-teto) e muitos outros estão sendo perseguidos politicamente", finalizou o deputado. [r]

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secretário fica nervoso e erra
ao responder críticas sobre transporte

por rafael sampaio

Os moradores de São Paulo têm razões para reclamar do transporte público da cidade. Existem 3.318 ônibus velhos circulando pelas ruas paulistanas, de acordo com a Secretaria Municipal dos Transportes (SMT). Estes ônibus - que são 22,12% da frota - têm mais de dez anos, a idade máxima até que devam ser trocados por veículos novos. Tal limite de idade está estabelecido em todos os contratos firmados entre a prefeitura e as empresas concessionárias das linhas de ônibus.

O Secretário dos Transportes, Frederico Bussinger, argumenta que é preciso rever os contratos. “Esta lei dos dez anos é burra”, diz ele, exaltado. O nervosismo pouco a pouco tomou conta das respostas de Bussinger, que também é engenheiro. Ele chegou a ficar com o rosto vermelho e elevou o tom de voz. O Secretário equivocou-se, ao mencionar a última renovação da frota de ônibus em 1996 e usar repetidamente a palavra “2006” para se referir ao ano citado.

Após este instante de exasperação, em que chegou a sugerir que só 1.500 ônibus estão velhos, desmentindo as informações da Secretaria, Bussinger respondeu que pretende substituir gradualmente a frota antiga até que acabe o mandato do prefeito Gilberto Kassab (PFL).
Só em 2006, a SMT pretende trocar 689 veículos “caducos”. Outra solução apontada pela Secretaria é o uso de um “selo de qualidade dos ônibus”, que será colocado atrás do banco do cobrador, para que os próprios usuários verifiquem se os veículos estão em bom estado.

Para Bussinger, há ônibus com dois anos que estão em péssimas condições e outros, com dez anos, que ainda podem ser usados sem problemas. Por isso a lei dos dez anos “é burra” e precisa ser modificada. A Secretaria justifica a quebra da regra dos dez anos com a afirmação de que ela é comum a todas as gestões anteriores da prefeitura.

“Quando José Serra assumiu, ele herdou cerca de 800 ônibus velhos da gestão anterior”, argumenta o Secretário. Para ele, se os 3.318 ônibus fossem adquiridos imediatamente, a prefeitura pagaria um valor estratosférico para cada veículo. “Este custo, se houver, será pago com o aumento de tarifas dos usuários”, brada o secretário.

Problemas

Além do envelhecimento da frota, há problemas como a retirada de inúmeros ônibus de circulação, o sucateamento dos que restaram, a superlotação dos pontos de embarque e o excesso de trânsito.
Existem cerca de 15 mil ônibus na cidade, mas, segundo o vereador Antônio Donato (PT-SP), que integra a Comissão de Trânsito e Transporte da Câmara Municipal da cidade, houve uma redução na frota feita às escondidas. Na apuração feita pelo vereador, a prefeitura fez um acordo informal com as concessionárias e permitiu que fossem retirados 8% dos ônibus em circulação (1,2 mil) para diminuir o gasto das empresas. “O acordo da prefeitura é irregular e quebra o contrato entre o poder público e a iniciativa privada”, reclama Donato.

O Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores do Transporte Público de São Paulo avaliou, em 2005, que a frota havia sido reduzida em 3%, ou 441 veículos.

Para o ex-Secretário dos Transportes, Carlos Zarattini, que foi colega de Bussinger quando os dois trabalharam para a gestão de Marta Suplicy, há uma série de problemas acumulados pela pasta. “Cresceu o engarrafamento no trânsito e a superlotação dentro dos veículos nos horários de pico, e a SMT não têm sabido lidar com isso”.

Mudança de planos
Zarattini crê que a solução para a superlotação e o engarrafamento é a continuação do projeto dos corredores de ônibus e dos terminais de transferência pela cidade, iniciados durante a gestão anterior. “Não se pode desfazer este projeto. O [Frederico] Bussinger participou da elaboração dele durante o mandato da prefeita Marta. Eu não entendo porque ele quer abandoná-lo”, diz.

O programa elaborado durante a gestão petista prevê a instalação de cinco eixos de corredores de ônibus para 2005, quatro para 2006, totalizando 325 quilômetros exclusivos para os ônibus até 2008. No entanto, nem um metro de corredor foi entregue no ano passado.

Só duas obras estão previstas no ano de 2006: o Corredor Expresso Cidade Tiradentes, conhecido como “Fura Fila”, e o prolongamento do Corredor Ibirapuera. Segundo Zarattini, a opção da prefeitura em levar as duas obras adiante é um erro, porque o Fura-Fila é muito caro. “É uma ‘herança maldita’ da gestão [de Celso] Pitta”, avisa.

Ele questiona também a política da prefeitura quanto ao uso do bilhete único. “Os benefícios sociais da população, como a chance de usar quatro ônibus por duas horas, estão sendo pouco a pouco cortados na atual gestão da prefeitura”, reclama.

Zarattini critica ainda o cadastramento do bilhete único realizado pela SMT. Para ele, quem perde são os cidadãos mais pobres e ignorantes, que não se cadastram para andar pela cidade e chegam a gastar seis reais para sair dos bairros de periferia onde vivem. “A SMT quer ‘tirar o couro’ dos mais pobres e aumentar seus rendimentos com o dinheiro deles.”

Já o atual Secretário dos Transportes comemora o cadastro. “Há cerca de 2,8 milhões de cidadãos cadastrados. As fraudes diminuíram quase a zero”. Ele não nega que ainda haja fraudes, mas estipula uma redução de sete milhões de infrações por mês com o uso do bilhete único cadastrado.

Bussinger é a favor do bilhete único, que trouxe benefícios econômicos à população e levou “mais de 500 mil pessoas a usarem o transporte público em vez de automóveis”. Mas sem o controle do cadastro, na opinião do engenheiro, “o risco de fraudes é grande”.

Trânsito
A Secretaria dos Transportes planeja resolver o problema do trânsito paulistano pelo corte de linhas de ônibus. De acordo com Bussinger, há superposição das linhas e muitas fazem trajetos parecidos. Há excesso de veículos em alguns itinerários e escassez em outros. Ele anunciara, em março, a redução de 37,7% das linhas de São Paulo, de 829 para 315. “Estudos mostram que quanto maior o número de ônibus circulando pelas ruas, mais caótico e congestionado fica o trânsito”, detalha.

Existem determinadas metas que Bussinger espera cumprir até o fim do seu mandato. Uma delas é a de alocar, no máximo, seis usuários de ônibus por metro quadrado de espaço no veículo. Outra meta é garantir que qualquer pessoa tenha que esperar no máximo 15 minutos por seu ônibus. Por último, o Secretário espera que, no futuro, nenhum munícipe tenha que andar mais do que 500 metros para chegar até um ponto de ônibus.

Não há, entretanto, qualquer sinal de que o “programa de racionalização” vá ser implantado, ou que será possível alcançar as tais “metas”. A própria Secretaria, ouvida pela reportagem, silenciou sobre o programa de racionalização. “A população ficará a par das mudanças conforme elas vierem a ser feitas”, informou, em nota oficial, a SMT. [r]

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direitos humanos encontram
barreiras no modelo econômico


CONFERÊNCIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
tadeu breda

Cada vez que se fazia uma crítica ao modelo econômico vigente, os aplausos eram inevitáveis. Foi assim que a platéia ovacionou repetidas vezes o líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra), João Pedro Stédile, e a professora de políticas públicas da UFRJ, Laura Tavares, na abertura da 10a Conferência Nacional dos Direitos Humanos, em Brasília.

Num tom que usualmente não é o seu, Stédile afirmou que a desigualdade social vigente no Brasil é o maior problema de direitos humanos do país. “Se não tivermos coragem de mudar essa política econômica, seremos eternamente bombeiros do capital. Sem mudança, não há direitos humanos que resolva o problema do povo.” O alvo principal do ataque foi a prioridade que o governo dá ao superávit primário, ou seja, ao pagamento da dívida externa, em detrimento dos investimentos sociais.

Para o líder do MST, o imperativo da mudança se coloca em números. São 120 milhões de pobres no Brasil, 10 por cento de desemprego (o dobro na Grande São Paulo, triplo entre a população jovem), cerca de 1 trilhão de dólares em riquezas transferidas da América Latina à Europa e Estados Unidos na última década, 30 por cento do arrecadado pela União destinado ao pagamento de juros.

“O capitalismo explora não mais pela mão-de-obra barata, mas pela alta taxa de juros imposta pelos bancos ao governo. Assim o sistema consegue explorar não só o trabalhador operário, mas toda a população”, diz Stédile. “Eles nunca lucraram tanto como agora.” O Bradesco, por exemplo, maior instituição financeira do país, anunciou um lucro de 1,53 bilhão somente no primeiro trimestre deste ano.

Desigualdade

Para o líder do MST, o modelo econômico aplicado no país desde a colonização conseguiu desenvolver o Estado e gerar riquezas, mas fracassou em combater a pobreza e a desigualdade social. Desigualdade, aliás, que pode ser observada de forma gritante no Distrito Federal. Brasília é como uma cidade de país desenvolvido. Arborizada, gramas aparadas, ruas impecavelmente asfaltadas. Os veículos páram na faixa para a passagem dos pedestres. Não há muros. É como se fosse um imenso parque. Isso até dentro do Projeto Piloto elaborado por Oscar Nyemeier. No entorno, as cidades satélites são pobres, carentes de recursos básicos, conurbadas. Diz-se que Brasília é de primeiro mundo; o Brasil mesmo está em volta.

A opinião é compartilhada por Laura Tavares, da UFRJ. “Não agüento mais a palavra ‘inclusão social’. Inclusão onde? Neste mercado? Ensinar o pobre a mexer em computador para ele competir com quem? Com universitário que fala duas línguas e que mesmo assim não consegue emprego?”, disse em tom bastante combativo.

Sua exposição também foi no sentido da crítica ao modelo econômico, com o qual, na visão da acadêmica, não há desenvolvimento humano possível. Stédile há pouco havia lembrado da situação de bem-estar social nos países ricos do Norte, apenas alcançada com a exploração de recursos e geração de pobreza nas nações do Sul. Na visão dos palestrantes, é como se o neoliberalismo tivesse a necessidade de balancear riqueza com pobreza, em nível nacional e global.

Laura Tavares finalizou falando da importância de o Estado ter políticas públicas de inclusão, independente de ongs. “Mais da metade dos projetos sociais no Rio de Janeiro são tocados por ongs. São importantes, ajudam uma série de pessoas, mas têm data marcada para acabar.”, lamenta. “Projeto social se faz com política pública permanente, pelo Estado. Por isso, não podemos permitir a desvinvulação de verbas sociais em detrimento do superávit primário.” [r]

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