21.11.06

 

o mst e a maior participação do povo na determinação dos rumos do Brasil

por marcos angelim

Em 15 de novembro de 1889, concretizavam-se uma aparente mudança política e uma verdadeira repetição histórica no Brasil. A mudança era a passagem do Império para a República; a repetição, o fato de que, assim como no processo de independência política em relação a Portugal, o povo não participava efetivamente da modificação de regime. Como afirma o historiador Boris Fausto, “a queda da Monarquia restringiu-se a uma disputa entre elites divergentes”.

Não tendo participado, o povo não tem o que festejar e fica fácil desculpá-lo pela falta de civismo que demonstra ao aproveitar feriados como o de 15 de novembro simplesmente para descansar ou reunir a família numa comilança regada à cerveja. Eu, como não sou chegado a churrascos e reuniões familiares, aproveitei o feriado e uma carona para conhecer de perto, no Pontal do Paranapanema, um movimento social que deseja escrever uma nova história. Estou falando do MST.

A maioria de nós conhece o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra através das lentes da grande mídia, que a maior parte das vezes enfatiza seus excessos táticos na luta pela reforma agrária, esquecendo (?) toda a verdadeira transformação que o movimento empreende na esfera social. A edição de Veja de número 1648, de 10 de maio de 2000, é um emblema desse tratamento midiático conferido ao MST e a outros movimentos sociais. Mas o que realmente é ignorado no MST pela grande mídia?

O fenômeno sócio-político mais importante que a mídia ignora – ou inverte – quando aborda o MST é a organização e a politização das massas excluídas. Esses aspectos aparecem nos meios de comunicação travestidos de baderna e doutrinação ideológica de esquerda. De fato, o discurso dos líderes do movimento é carregado de conteúdo ideológico, mas que direito tem a mídia de exigir sua subserviência aos valores da democracia liberal capitalista, se neste sistema pouco ou nada conseguem os excluídos e se os próprios mass media propagam os valores das elites a que pertencem?

Um dos principais fatores da insignificante participação popular na determinação dos rumos da nação foi a inexistência, durante séculos, de movimentos sociais organizados capazes de forçar as elites a ceder às classes populares um lugar nos centros decisórios. Sem eles, o povo ora foi ou um joguete das elites, ora um expectador das mudanças (?) que elas empreenderam na história brasileira. E é essa força mobilizadora que leva as elites a temer o MST.

Esse movimento social, independentemente da viabilidade política e econômica de seu projeto de reforma agrária, tem o grande mérito de agregar excluídos do campo e das cidades, canalizando a energia dessa gente para a participação política além-voto. Não é difícil imaginar para onde sua força social se dirige quando não engajados na vida política. Mas nossas elites parecem preferir gastar com carros blindados e segurança privada em suas ilhas residenciais de luxo a ver o povo marginalizado organizado politicamente. Talvez considerem que dividir o bolo ainda saia mais caro...

Nos municípios de Teodoro Sampaio e Mirante, visitei um acampamento à beira da estrada e um assentamento nos quais, além de entrar em contato com a realidade dos assentados, conversei com duas importantes lideranças do MST.
O acampamento impressiona pela simplicidade das barracas de lona onde dezenas de famílias aguardam a regularização da terra pelo Incra. É gente simples, oriunda dos campos do Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul. Já no assentamento, as famílias têm suas casas de alvenaria, com energia elétrica, água encanada e seus respectivos lotes demarcados; contam também com escola de ensino fundamental I e II e posto de assistência odontológica.

Mas nem tudo são rosas nos assentamentos. Segundo os assentados, a assistência médica ainda é precária, o assentamento não possui escola de ensino médio – o que obriga seus jovens a sair do assentamento para ir a escolas distantes – e as dificuldades para conseguir financiamento para a produção agrícola ainda são grandes.

Apesar disso, segundo José Rainha, o MST pretende tomar parte nos projetos governamentais de produção de energia renovável, a saber, de biodiesel. Para ele, com apoio do BNDES, os assentados do Pontal poderão cultivar oleaginosas, como a mamona e o girassol. Até agora a produção de biodiesel se dá pela iniciativa privada em parceria com o governo federal e alguns governos estaduais.

Ninguém pode prever o futuro do MST, nem saber se os assentamentos vão se revelar um modelo duradouro e economicamente bem-sucedido de organização da agricultura familiar, mas a reforma agrária ainda parece estar longe do fim. De acordo com Diolinda, também coordenadora do movimento e esposa de Rainha, o MST ainda levará cerca de 15 anos para assentar todo o contingente de trabalhadores sem terra do Brasil.

O tempo que isso levará não tem tanta relevância. O mais importante é que o MST e outros movimentos sociais continuem sua missão de organizar os excluídos de maneira que possam interferir efetivamente no processo de construção do Brasil.
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comentários:
Marcos Angelin parabéns pelo texto!
 
Marcos, e aí?
não entendi o romantismo do final: "O tempo q isso levará não tem tanta importancia" ?? como assim?
Claro q tem!
Ah, mas o texto está ótimo, viu?!
Parabéns!
 
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